sexta-feira, 6 de maio de 2016

LG G Flex sacrifica a função em nome da forma

Por Rafael Rigues
 
Tela curva e imensa chama a atenção de todos ao redor, mas a qualidade de imagem sofre muito por causa dela.
Todo bom produto tem um “gancho”, uma característica projetada para fisgar a atenção do consumidor. Pode ser o sabão “que lava mais branco”, o sanduíche que é “o melhor da cidade”, a gasolina “que limpa o motor”, e por aí vai.

Com os smartphones não é diferente, e o G Flex talvez tenha o melhor gancho de todos: sua tela curva, que aliada ao tamanho do aparelho funciona como um imã para os olhos de quem está por perto. Na semana em que passei com ele, por várias vezes bastou tirá-lo do bolso para alguém entusiasmado me perguntar “Ei, esse é o G Flex? O que acha dele?”.
Infelizmente, minha resposta não compartilha do mesmo entusiasmo.

Design

Visto de frente o LG G Flex lembra o LG G2, só que maior, mais fino e curvo. É como aqueles personagens de desenho animado que, atropelados por um rolo compressor, viram uma panqueca. O tamanho assusta mesmo quem está acostumado com “phablets”: são 8,1 cm de largura por 16 cm de altura, com espessura de 8,7 mm e peso de 177 gramas. Definitivamente não é um aparelho para quem tem mãos pequenas.

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Perfil do LG G Flex
Na traseira, que é fixa, há o mesmo conjunto de botões do LG G2 posicionados logo abaixo da lente da câmera: dois botões para controle de volume, com um botão “liga/desliga” iluminado entre eles. A traseira tem um acabamento liso com uma característica única: uma cobertura especial que é capaz de se “regenerar”, eliminando pequenos riscos no plástico causados pelo uso no dia-a-dia.

Não testei explicitamente este recurso, mas em demonstrações realizadas pela LG riscos feitos por uma escova com cerdas de aço realmente desapareceram após o aparelho ser exposto a uma temperatura de 30 graus por 3 minutos (quanto menor a temperatura, mais tempo necessário). Mas antes de atacar seu aparelho com uma chave de fenda para mostrar aos amigos, lembre-se: são pequenos riscos, daqueles que você só vê contra a luz, e não talhos de facão. E a proteção não se estende à tela, já que a camada protetora não tem a transparência necessária para isso.

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Traseira do G Flex tem o mesmo arranjo de botões do G2

Com o nome indica, o G Flex é flexível. Novamente, atenção à palavra: “flexível”, não “dobrável”. Se você colocar o aparelho sobre uma mesa, com a tela virada para baixo, e aplicar força na metade da traseira, pode “endireitá-lo” sem causar danos. Além de impressionar os amigos, isso dá ao aparelho maior durabilidade: se você se sentar com ele no bolso de uma calça apertada, as chances da tela quebrar por causa de uma torção são menores.

Tela flexível, mas a que custo?

A frente do LG G Flex é dominada por uma tela de 6” com resolução HD, ou seja, 1280 x 720 pixels. É uma tela fisicamente maior que a do LG G2, que tem 5,2”, mas com resolução menor (o G2 tem uma tela Full HD, 1920 x 1080 pixels). Por si só essa combinação resultaria em uma degradação na qualidade de imagem em relação ao seu antecessor, mas esse é o menor dos problemas com a tela do G Flex.

A tela usa a tecnologia P-OLED, ou seja, LED Orgânico (OLED) sobre um substrato plástico, o que permite a curvatura e dá flexibilidade. Mas trata-se da primeira geração desta tecnologia, e nenhuma estréia é perfeita. Para começo de conversa, as imagens tem um tom muito mais “acinzentado” e frio que o esperado. E há ruído visível na imagem, que é mais evidente quanto mais baixo o brilho da tela, ou nas áreas mais escuras.

É algo que não aparece em screenshots e é difícil mostrar em fotos, mas é evidente “em pessoa”: a imagem parece ter sido impressa em uma impressora jato de tinta de baixa qualidade, e as cores nunca são sólidas. Por um momento cheguei a pensar que a LG havia adicionado uma “textura” à interface escura do Android, antes de notar que era ruído.

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Detalhe da tela do G Flex, com ruído visível nos tons de azul. Clique para ampliar

Para piorar, notei retenção de imagem, os populares “fantasmas”: se uma imagem fica na tela por alguns segundos (por exemplo, a tela inicial), ao trocar para uma nova imagem (como uma janela do navegador) uma “sombra” do conteúdo anterior é visível por cerca de um segundo. Isso é mais notável na transição de uma imagem escura para uma imagem clara, e vice-versa, e novamente mais evidente quanto mais baixo o brilho da imagem.

Fixar o brilho da tela em 70% ou mais ameniza bastante os problemas, e ele são pouco perceptíveis no brilho máximo. Mas isso sacrifica a autonomia de bateria, e o brilho excessivo pode causar fadiga visual.
Por dentro o G Flex é ainda mais parecido com o G2. O processador é o mesmo Snapdragon 800 (MSM8974) quad-core rodando a 2.26 GHz, acompanhado de uma GPU Adreno 330 e 2 GB de RAM, embora tenha o dobro de memória interna, 32 GB. Não há um slot para cartões microSD.

O G Flex é um smartphone 4G, e também é compatível com todos os padrões de Wi-Fi em vigor: 802.11 a/b/g/n e ac. Também tem interface Bluetooth 4.0 para comunicação com acessórios e um emissor infravermelho no topo, que junto com o app Quick Remote (pré-instalado) permite seu uso como um controle remoto universal para os eletrônicos de sua casa.

A porta micro USB na parte de baixo é na verdade uma SlimPort, e com um adaptador vendido separadamente pode servir como saída HDMI para conexão a uma TV ou monitor externo. A porta também suporta USB On-The-Go, a tecnologia usada pelos novos “pendrives para smartphone” produzidos por empresas como a Sandisk, que facilitam a troca de arquivos entre o smartphone e um PC e podem ser uma forma de contornar a falta de um slot microSD para expansão da memória interna.

Software

O sistema operacional do G Flex é o Android 4.2.2, com a mesma interface e modificações encontrados no G2, entre eles os “mini aplicativos” QSlide Apps e alguns dos mesmos apps. Entre eles o LG Backup, que permite fazer backup, sob demanda ou agendado, das informações no aparelho, incluindo configurações, apps baixados e dados (músicas, fotos e vídeos) armazenados no cartão.

Outro recurso que já havia visto no G2 e no tablet G Pad 8.3 é o “Knock On”: é possível ligar a tela com duas batidinhas com o dedo sobre ela, e desligá-la com outras duas. É algo muito prático no dia-a-dia, ainda mais se considerarmos que o botão liga/desliga fica na traseira do aparelho.

Câmera

O LG G Flex parece usar o mesmo módulo de câmera com sensor de 13 MP usado no G2. Ao menos esta é a conclusão que chego ao comparar imagens feitas com ambos os aparelhos.
As fotos noturnas, por exemplo, são quase idênticas, e sofrem com um algoritmo de redução de ruído agressivo demais, que prejudica a nitidez e acaba destruindo os detalhes da imagem. Exatamente como disse no review do G2, “numa foto noturna paredes de prédios perdem a textura, folhas de árvores viram uma massa verde, e tudo fica com cara de aquarela”.

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Foto noturna feita com o LG G Flex. Clique para ampliar

Já as fotos diurnas são boas, embora em situações de alto contraste o sensor tenha a tendência a priorizar as áreas mais escuras da imagem, “estourando” as mais claras. Felizmente isso é algo que pode ser corrigido usando o modo HDR (que a LG chama de “Tom Dinâmico”), que produz resultados muito mais equilibrados.

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Foto diurna feita com o LG G Flex. Clique para ampliar

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Nesta foto o G Flex expôs corretamente o carro, mas "lavou" o fundo. Clique para ampliar.

O software da câmera tem os mesmos recursos do LG G2, entre eles dois modos panorâmicos (um tradicional e outro com fotos em 360 graus), captura dupla (fotos com a câmera traseira e frontal na mesma imagem) e disparo contínuo (Burst), entre outros.

O G Flex grava vídeos em Full HD (1920 x 1080 pixels a 60 quadros por segundo) e permite até mesmo usar as duas câmeras ao mesmo tempo: a imagem de uma das câmeras ocupa a tela toda, e a da outra fica em uma “janelinha” num canto da tela. Essa janela pode ser posicionada à vontade (basta arrastar com o dedo) e com um toque nela é possível alternar as câmeras. Ideal para gravar “podcasts” ou as férias da família e ainda aparecer no vídeo.

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Comparativo entre uma foto no modo automático (esquerda) e no modo HDR (direita).
Clique para ampliar.

Desempenho e Autonomia de Bateria

Por ser baseado na mesma plataforma de hardware do LG G2, esperava que o LG G Flex tivesse os mesmos resultados em nosso conjunto padrão de benchmarks. Mas na verdade ele se saiu um pouco melhor do que seu antecessor.

Isso pode ser explicado pela tela: a do G Flex tem resolução HD, enquanto o G2 tem uma tela Full HD. Ou seja, são 45% menos pixels no G Flex, o que exige menos trabalho da GPU. Por isso no 3DMark, um conjunto de testes que mede o desempenho gráfico, o G Flex gabaritou os testes Ice Storm e Ice Storm Extreme (que foram considerados “leves demais” para o aparelho), enquanto o G2 gabaritou apenas o Ice Storm e fez 9.910 pontos no Ice Storm Extreme.

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Desempenho do G Flex no AnTuTu. Clique para ampliar

Já no AnTuTu, que mede o desempenho geral do aparelho, incluindo também o desempenho gráfico, o G Flex fez 36.263 pontos, superando com folga o G2 (31.021) e o Sony Xperia Z1 (33.951), um concorrente baseado no mesmo hardware. Na verdade o G Flex superou o tablet Gradiente Tegra Note (34.901 pontos), que até o momento era o Android mais rápido que já tinha passado por nossas mãos.

A autonomia de bateria do G Flex também agradou, e não esperava menos considerando a imensa bateria de 3.400 mAh. Após uso típico durante um dia de trabalho, incluindo cerca de 2 horas de navegação e leitura via 3G, algumas fotos, poucas chamadas e mensagens e atualização constante de e-mails e redes sociais em segundo plano, ele ainda tinha cerca de 55% de carga após 13 horas e 22 minutos fora da tomada. Já no teste de reprodução de vídeo, feito com o brilho da tela em 50% e o aparelho no modo avião, consegui uma autonomia de cerca de 16 horas e 40 minutos reproduzindo um vídeo em HD.

Veredito

Não há dúvida que o G Flex (R$ 2.699, preço sugerido pelo fabricante) é poderoso e tem excelente autonomia de bateria, mas em nome do design ele sacrifica a característica mais importante em um smartphone moderno: a qualidade de imagem, que é inferior mesmo à de smartphones que custam quase um quarto do preço, como o Moto G.

A curvatura da tela não traz nenhuma vantagem do ponto de vista prático: a ergonomia ao falar ao telefone é a mesma, e embora a LG afirme que o microfone mais próximo da boca melhora a qualidade da voz nas chamadas, não notei isso na prática.

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Até a caixa do G Flex é curva

E mesmo curvo ele é grande demais no bolso e desajeitado nas mãos: usá-lo com uma mão só requer verdadeiros malabarismos, com reposicionamento constante do aparelho para alcançar com o dedão as diferentes partes da tela.

A não ser que você faça questão de estar na “crista da onda” da tecnologia de telas e seja um jogador de basquete com mãos imensas, não há motivo para escolher um G Flex em vez de um aparelho muito similar e muito mais barato como o G2. Telas curvas podem ser o futuro, mas dá pra esperar um pouco mais antes de correr para lá.

Fonte:  http://pcworld.com.br/reviews/2014/04/14/lg-g-flex-sacrifica-a-funcao-em-nome-da-forma/

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